Copo de 3: A Excelência do Imediato

12 março 2013

A Excelência do Imediato


A pergunta quase sempre vem ao de cima, aquela dúvida que mora no pensamento, afinal quanto tempo devem durar em garrafa os vinhos que pulam para o mercado rotulados como sendo Grandes Vinhos ? Quantos anos é que um exemplar desse suposto calibre tem a obrigação de se aguentar ou até mesmo evoluir de maneira nobre na garrafa ?

Reparo que alguns vinhos dos supostos "melhores" que vou guardando religiosamente no condomínio de luxo chamado garrafeira climatizada, ao abrir o comportamento é o menos esperado em que nada  condiz com o prestígio que lhes foi atirado para os ombros a determinada altura, quase sempre na altura do seu lançamento para o mercado, vinhos cujo preço nunca é meigo. Nestes casos há sempre duas desculpas que alguns muito prontamente gostam de   despejar para cima da mesa, "a má garrafa" e "as condições de guarda". Fará sentido invocar a "má garrafa" quando se fala de vinhos com pouco mais de 10 anos em garrafa ? E se as condições de guarda são as ditas ideais, se os vinhos assim que saíram para o mercado vieram directamente para uma cave climatizada, que condições de guarda são essas ? Nestes casos comparo no imediato com exemplares mais "velhos" que tenho, que vou comprando por atacado em armazenistas.

Faço um aparte para explicar no que aos vinhos com mais idade diz respeito, na altura da compra a minha única preocupação é o nível do líquido e ao mesmo tempo a tonalidade do vinho (sempre que perceptível). Visto isto é tentar comprar pelo melhor preço, regatear é quase sempre obrigatório e depois é aguardar esperar pelo momento da prova, o momento das grandes verdades. Por exemplo, na remessa de Tapada do Chaves Reserva 1986 direi que em cada caixa de 6 garrafas apenas 1 se mostrou menos bem. Ao colocar no copo, como tem acontecido, alguns vinhos mais recentes e de aparente elevado "status enófilo" a prova é em muitos casos bastante inferior senão mesmo de algum embaraço tendo em conta os inúmeros louvores  atribuídos na praceta. Vinhos que no meu caso tiveram desde que foram colocados à venda as ditas condições ideais de guarda, comparando com os "outros" mais velhos que sabe-se lá em que condições aquelas pobres almas andaram até chegarem às minhas mãos.

Talvez tenha tido azar, talvez azar a mais da minha parte quando acontece em mais do que uma garrafa do mesmo ano, já são tantos os que foram sendo provados com apenas 4 ou 5 anos de vida e catalogados como Sua  Excelência e o efeito no copo não se resume a tal... falham completamente esse compromisso de uma prometida prova dos Deuses e passam a dar uma prova banal e terrena onde tantos outros vinhos (alguns de aparência mais modesta) se portam melhor. A impressão com que fico é que tudo isto se resume à Excelência do imediato, que parece que o vinho é feito para ser avaliado num curto espaço de tempo e depois imagina-se um futuro radiante para o dito sem que nunca se vá questionar quem escreveu quando a coisa passado uns anos corre para o torto. Salvo as honrosas excepções daqueles que  têm brilho próprio e que perduram no tempo, pois não quero enfiar tudo no mesmo saco, parece que há vinhos lançados um pouco por todo o lado que sofrem de evolução precoce, estando aptos para o consumo cedo demais, como se tudo viesse apressado, demasiadamente harmoniosos, precocemente evoluídos e estupidamente afinados.

4 comentários:

Unknown disse...

Ainda recentemente li na Wine Spectator um artigo (http://www.winespectator.com/webfeature/show/id/47848) que abordava esta mesma questão.

Aparentemente na opinião do autor daquele artigo os vinhos já não são feitos para durar tanto tempo como antigamente e chegam muito mais rapidamente ao seu pico (e por consequência também ao seu declínio).

Acho que em parte a solução passa por se perceber que os vinhos hoje em dia não precisam de tanto tempo como antigamente. Pessoalmente até vejo algumas vantagens nisso tais como o se poder aproveitar mais cedo alguns grandes vinhos. Claro que pelo outro lado também mais cedo começam a perder o que eram.

João de Carvalho disse...

Certo que a moderna enologia permite colocar e aprontar os vinhos para um consumo mais cedo, mais prontos e despachados.

No entanto os Grandes continuam a ser os de guarda, aqueles que perduram na garrafeira e que conseguem atingir o "afamado" bouquet ou refinada complexidade, isto é algo que apenas o tempo e em alguns casos é preciso muito, para que se consiga.

Se o vinho que compras por 35€ ou mais, dá uma prova bonita no imediato, onde tudo parece bem posto, há aromas que ali não moram porque não tiveram tempo para isso... passados 5 anos arriscas a que o vinho esteja a tremer dos joelhos ou já completamente nas lonas. Curiosamente é deste tipo de "aberrações" que cada vez mais tento fugir e evitar.

momenta disse...

Este é um tema que me interessa muito, mas ainda estou nos primeiros passos. Para já, só guardo alguns vinhos que já provei e avaliei, dentro dos meus parcos conhecimentos, a questão acidez/estrutura. Como tal, não arrisco e não estou a guardar até mais de 8 anos após a colheita.
Nota-se perfeitamente o mercado a apostar em vinhos em boas condições de consumo, afinal, os produtores precisam de vender e os "guardadores pacientes de vinho" serão uma percentagem ínfima dos compradores. Para mais de 10 anos de guarda, neste momento, só arriscaria alguns garrafeira.
Mas espero aprender mais umas coisas e daqui a uns anos ter horizontes mais alargados.

Ricardo Cruz

Anónimo disse...

Caro João Pedro,

Concordo plenamente consigo.

Apenas acrescentava, indo de encontro ao que também escreve, "Salvo as honrosas excepções daqueles que têm brilho próprio e que perduram no tempo, pois não quero enfiar tudo no mesmo saco", era de primordial importância que o João e outros bloggers da área, uma vez que espera isso dos "críticos" é pouco provável, viessem revelar esses vinhos que não evoluem nobremente, apresentado as notas de prova e classificando-os com notas suficientemente penalizadoras.

Fico a aguardar.

PR

 
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