Copo de 3: UM COPO DE 3 de... TRINCADEIRA

02 novembro 2005

UM COPO DE 3 de... TRINCADEIRA

Durante os próximos tempos vai ser incluida uma nova rubrica intitulada UM COPO DE 3 de...
Assim durante cada mês, vai-se destacar uma casta, com provas de alguns dos vinhos extremes dessa mesma casta, com o objectivo de assim dar a conhecer os diversos tipos de vinho que essa casta produz pelas várias zonas produtoras de vinho em Portugal e quem sabe lá por fora.
Assim cada mês, a informação essencial de cada casta será colocada no Copo de 3, tal como as Notas de Prova dos Varietais.

Para este mês de Novembro, a casta escolhida foi a TRINCADEIRA
Fica aqui pois então alguma informação sobre a mesma:

Trincadeira - A paixão pelo calor


A nobre Trincadeira

É uma casta de videira das mais prestigiosas entre o vasto elenco do património vitícola das variedades nacionais e a tradição dos seus méritos levou-a a povoar os vinhedos de várias regiões. Percorrendo o País de Norte para Sul encontramos a casta com importante presença nos encepamentos do Douro, na Estremadura, no Ribatejo, na Península de Setúbal, no Alentejo e no Algarve.
A importância relativa da variedade não é constante de região para região, assumindo maior relevância em primeiro lugar no Alentejo, depois no Douro e finalmente no Ribatejo.
Conhecida em tantas terras de Portugal, era inevitável o aparecimento de vários sinónimos para designar a casta e assim é conhecida por:
Murteira – Dão
Trincadeira Preta - Alentejo e Ribatejo
Tinta Amarela - Douro e Trás - os - Montes
Mortágua - Torres Vedras e Alenquer
Preto Martinho - Arruda e Bucelas
Espadeiro ou Murteira - Setúbal
Crato Preto - Algarve
Castiço - Aveiras de Cima

Para o caso da casta que vimos abordando foi adoptado o nome TRINCADEIRA e admitido como único sinónimo Tinta Amarela pela côr das folhas quando jovens.

Uma casta difícil e sensível

Um dos aspectos mais salientes da morfologia externa da Trincadeira, é a sua folha jovem, Amarelada, donde lhe advém possivelmente o sinónimo Tinta Amarela, que se compreende perfeitamente ao olhar a paisagem dos pâmpanos numa parcela em contra-luz. A sua folha adulta é pentagonal, média, com cor verde de aspecto viçoso e saudável. O cacho é médio/grande e compacto na maior parte dos casos e o bago arredondado, médio/grande e negro-azul.
A película é pouco espessa, com polpa não corada e suculenta.

A Trincadeira possui algumas características que a tornam culturalmente difícil, é uma cultivar vigorosa, algo irregular na produção ao longo dos anos, mas que podemos considerar de bom rendimento, sobretudo se se utilizar para a propagação vegetativa material proveniente de Seleccção Clonal.
Poda-se geralmente em poda curta e em cordão bilateral, mas no caso de material menos fértil é aconselhável vara e talão. Dadas as particularidades da casta, a poda tem de ser muito criteriosa por forma a estabelecer-se uma vinha bem equilibrada quanto ao vigor e produção e as videiras com vegetação pouco densa. Cargas deficientes provocarão excesso de vigor, consequente agravamento dos problemas sanitários e retardamento da maturação. Cargas excessivas ocasionarão massas vínicas abundantes, mas de inferior qualidade.
Os porta enxertos mais indicados deverão ser pouco vigorosos e de ciclo curto, para não retardarem o momento da vindima.
É muito sensível às doenças criptogâmicas em especial ao oídio e às podridões - cinzenta e ácida, os cachos chegam a apodrecer no inicio da maturação e a pingar o suco dos bagos para o chão. É esta podridão ácida que mais preocupa, pelos prejuízos que acarreta e não sendo uma doença de todo nova, experimenta crescente virulência, muito associada à Trincadeira, seja no Alentejo no Ribatejo ou no Douro.
Quem não conhecer ou identificar esta variedade e queira fazer uma pequena experiência, passeie-se em finais de Agosto, ou princípios de Setembro, por entre uma vinha misturada de castas.
Vá olhando para o chão, por baixo das videiras.
Se encontrar pingos côr de vinho no chão - por vezes mesmo pequenas poças ou “riscos” quase contínuos de pingos, não tem nada que enganar, ou é Trincadeira, se os bagos forem médios, ou Baga, se os bagos forem miúdos.
Voltando à doença e no estado actual do conhecimento que é ainda incipiente, constata-se a presença associada, como causa ou efeito (?), duma mosca drosófila que põe os ovos no interior dos bagos e transportará nas patas bactérias acéticas. Da postura resultam larvas - às centenas ou milhares, que consomem e desorganizam a estrutura da polpa do bago, apodrecem os bagos e contaminam os vizinhos. Das bactérias resulta o desenvolvimento de acido acético - responsável pela azedia e elevação da acidez volátil e em casos graves, chega mesmo a haver um forte cheiro a azedo nas vinhas atacadas e os vinhos daí resultantes estarão condenados à destilação por nascerem com acidez volátil da ordem dos 0,8 a 1,2 g/l.

A selecção clonal

Decorrente da importância e mérito da casta, a Rede Nacional de Selecção da Videira iniciou em 1986, os trabalhos correspondentes à primeira fase do respectivo melhoramento genético e sanitário, com a prospecção de 271 pés-mães em vinhas do Alentejo, Douro, Estremadura, Pinhel e Ribatejo.
A segunda fase desenrolou-se a partir da enxertia duma colecção em Almeirim, onde foram feitas múltiplas observações e avaliações que culminaram com a eleição dos 40 melhores clones segundo o rendimento.
Na terceira fase ,estes 40 clones foram enxertados em dois campos de experimentação clonal - um no Cartaxo e outro em Reguengos, e as avaliações incidiram sobre o rendimento (5 anos), o açúcar e a acidez total (4anos), e a riqueza antociânica (3 anos).
Nesta fase, que se inicia 5 a 6 anos após o começo dos trabalhos, os campos de experimentação clonal são simultaneamente campos de multiplicação, que permitem, desde logo, o fornecimento à viticultura de garfos para enxertia - material policlonal, ou selecção massal de clones, propiciador de excelentes ganhos qualitativos e quantitativos em relação à anterior população da casta.
A elevada variabilidade genética encontrada, permitiu seleccionar um novo grupo de 12 clones, integrando os melhores em cada um dos quatro parâmetros referidos e os melhores no conjunto. Este grupo, já com uma grande pressão de selecção e bastante restrito, tem sido alvo de aprofundados estudos, incluindo microvinificações e indexagens para despiste de vírus considerados nocivos para a vinha . A caracterização cultural e enológica de cada um desses 12 clones encontra-se em fase de conclusão e de entre eles deverão sair cerca de 6 para serem submetidos, já em Outubro próximo, a homologação pelos competentes Serviços do Ministério da Agricultura .
Ter-se-ão passado 15 anos de um trabalho altamente meritório - feito em tempo quase record, mas a Viticultura Nacional passará a dispor de material de propagação vegetativa de Trincadeira, com outro gabarito genético e sanitário, o qual contribuirá para o alargamento da importância da casta e para a subida qualitativa dos seus vinhos.
Em resumo a Selecção Clonal da Trincadeira encontra-se em fase adiantada e o aparecimento de clones seus no mercado, acontecerá dentro de dois ou três anos para satisfação dos adeptos deste tipo de material.
Por nossa parte continuaremos a preferir o material policlonal saído da Selecção Massal de Clones, que achamos ser mais interessante para a Viticultura Nacional, enquanto garante de maior variabilidade da casta, de melhor adaptação à diversidade das ecologias próprias de cada região, de regularidade de produção e constância do perfil enológico.
A uva e o vinho

É na vertente enológica que a Trincadeira se afirma como grande casta, em nosso entender será mesmo uma das melhores no panorama nacional e igualmente uma das que, só por si, possui melhor perfil para a elaboração de vinhos elementares.
Não é de certeza uma casta para utilização indiscriminada em qualquer região, mas plantada no local que lhe convenha e cultivada a preceito, produzirá a contento da mais elevada qualidade. Costumamos dizer na gíria - ... “é uma noiva dificil de levar ao altar”... mas quando as uvas chegam sãs e bem maduras à adega, faz vinhos notáveis.
As melhores uvas de Trincadeira são provenientes de rendimentos nunca superiores a 60 hl/ha e estando livres de podridões e no ponto desejado de maturação (grau provável superior a 13º) proporcionarão vinhos naturalmente graduados, ricos em substancias fenólicas, com boa acidez, grande intensidade e bem equilibrados.
Com alguma frequência podem aparecer aromas estranhos, a sulfídrico, durante a fermentação, pelo que será aconselhável não prolongar os tratamentos com enxôfre nas vinhas além do pintor (fase em que os bagos tomam a sua cor definitiva) e proceder a um acompanhamento apertado aos finais de fermentação.
Os grandes Trincadeira possuem características particulares bem identificáveis; têm uma bela e carregada cor granada enquanto jovens e rubi mais tarde, são complexos e densos de fruta no aroma e sabor, estruturados e encorpados; lembram frutos vermelhos (ameixa preta e compota) e também especiarias (canela e cravinho).
Os taninos embora abundantes, são suaves e firmes pelo que os vinhos rapidamente se tornam redondos e aptos para o consumo enquanto jovens. Por outro lado, em razão do seu corpo e estrutura, revelam especial vocação para estágio em madeira, resultando muito valorizados na ligação ao carvalho nacional ou, melhor ainda, ao carvalho francês ; nesse caso virão a ser magníficos vinhos de guarda.

Trincadeira, não é para todos

A valia enológica da Trincadeira, num contexto de clara alteração dos encepamentos por parte dos viticultores portugueses, pode convidar à sua cultura em várias regiões.Cuidado!... Trata-se duma casta com sensibilidades e exigências superiores ao comum!A sua expressão qualitativa só se afirma em pleno nas regiões de certa aridez - solos pobres com ligeiro deficit hídrico a partir do vingamento e clima seco e quente ao longo da maturação.
São portanto de evitar as regiões da orla marítima, ou onde a influência atlântica seja sensível, igualmente as zonas baixas e húmidas e os aluviões frescos.

In "Revista de Vinhos", nº130, Setembro de 2000 e elaborado pelo Engº Agrónomo e técnico de viticultura Luis Carvalho.

DESCRIÇÃO MORFOLÓGICA
RAMO JOVEM
Ápice vegetativo aberto, com pigmentação antociânica generalizada de fraca intensidade e com fraca pilosidade aplicada.
FOLHAS JOVENS
Amarelas com placas bronzeadas e com fraca pigmentação antociânica. Página inferior com média pilosidade aplicada e fraca erecta entre as nervuras e fraca pilosidade aplicada sobre as mesmas.
PÂMPANOS
Verdes nas 2 faces dos nós e entre-nós. Olhos sem pigmentação antociânica.
GAVINHAS
Distribuídas em 2 ou menos nós sucessivos e muito curtas.
FLOR
Hermafrodita.
VIGOR
Forte.
PORTE
Horizontal.
ÉPOCA DO PINTOR
Média.
FOLHA ADULTA
Média, pentagonal e quinquelobada. Página superior verde escura, com perfil irregular, médio empolamento, enrugada e ondulação generalizada. Dentes médios e convexos. Seio peciolar com lóbulos sobrepostos e a base em V. Seios laterais superiores abertos com base um U. Página inferior com fraca pilosidade aplicada entre e sobre as nervuras. Pecíolo mais curto que a nervura principal mediana e glabro
CACHO
Médio e compacto. Pedúnculo médio e com forte lenhificação.
BAGO
Médio, não uniforme, obovóide e com secção transversal regular. Epiderme negra-azul com média pruína. Película espessa e hilo pouco aparente. Polpa não corada, mole, suculenta e de sabor especial. Pedicelo curto e de difícil separação.
GRAÍNHAS
Com forte dureza do tegumento.
SARMENTO
Achatado, estriado-costado, amarelo e glabro.

7 comentários:

Anónimo disse...

Retirado de "Revista de Vinhos", nº130, Setembro de 2000 e elaborado pelo Engº Agrónomo e técnico de viticultura Luis Carvalho.

E pediu licença á Revista de Vinhos para utilizar os textos?

Jose Tomaz Mello Breyner disse...

Caro Anónimo

O João Pedro indica a fonte no seu artigo, pelo que não é necessári pedir autorização. E não teve coragem de assinar foi?

Anónimo disse...

Se for feita uma reprodução integral do texto é OBRIGATÓRIO um pedido prévio de autorização.

João de Carvalho disse...

Diz o Anónimo muito bem, SE... mas como pode verificar a reprodução do texto não é integral, caso tenha a dita Revista pode muito bem verificar.
E já agora fica sempre bem assinar com o seu nome.

Anónimo disse...

Esta gente só está bem a dizer mal e a levantar problemas...
Pois bem, fiquem descansados que pelo que parece o Copo de 3 sabe o que anda a fazer.

Continua assim Alentejano, um abraço do JS.

Anónimo disse...

a dor de côto é das piores!

Anónimo disse...

Ola a todos, sou fã desta casta porque é muito caracteristica da minha região estou a falar de Tras-os-Montes onde há bom vinho e de pouco conhecimento talvez tambem porque aqui a produção deve ser 90% caseira, no entanto penso que se pode encontrar bons vinhos a preços muito bons que não são inflacionados pela região em si como se vê em muitos vinhos do Alentejo e Douro, não tendo nada contra estas regiões que para mim são mesmo as melhores de portugal.
Como tal deixo o convite a provarem as "Trincadeiras" de Tras-os-montes nomeadamente as de Valpaços, sejam as da Adega ou mesmo as das Quintas.
Abraço a todos

 
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