Vivemos num mundo cada vez mais igual onde
somos dominados por padrões que imperam na sociedade moderna, fica difícil
contornar tudo isso, a roupa, a música, a comida... A globalização é um
fenómeno que pouco a pouco nos vai consumindo por dentro e por fora, e até
mesmo no mundo dos vinhos as semelhanças são cada vez mais acentuadas entre
vinhos da mesma região ou mesmo de regiões diferentes, a luta diária não de
todos mas de alguns produtores faz com que se deixe de lado o coração e se
pense com a carteira, o vinho industrializou-se e acima de tudo interessa
lançar no mercado um produto formatado ao gosto do consumidor. Com isto
perde-se quase sempre a identidade de um vinho, relegando claramente um
perfil de uma região para apenas mostrar o chamado perfil internacional...
nestes casos embora o vinho até possa ser de muito bom nível, tanto faz ser
produzido cá como noutro ponto do planeta.
Felizmente nos dias que correm ainda há
produtores que lutam contra essa corrente, quais Celtas a lutarem pelas
suas terras, pela sua identidade, tempos idos que nos dias de hoje se
reflectem em produtos como os vinhos Dona Berta,
propriedade do Eng.º Hernani Verdelho, uma figura ímpar do mundo enófilo que
transpira amor pelos seus vinhos e pela sua terra, é ter a oportunidade de
falar com este carismático produtor para saber do que falo. É nos 20 hectares
da Quinta do Carrenho em Freixo de Numão (Douro Superior), que nascem vinhos
distintos, de forte carácter e longa vida pela frente, onde as vinhas velhas
são rainhas e senhoras, num resultado final que deixa livremente mostrar a
região, sem desvirtuar,
sem extracção ou prensagem exageradas, sem madeira que
nunca se vai integrar e sem grau alcoólico disparatado, são no seu
todo vinhos com identidade muito própria mas que acima de tudo respeitam a
terra que os viu nascer.
Afinal de contas é um produtor que não vai
em cantigas ou modas e fruto disso é todo o seu portfólio que nos mostra vinhos
com um carácter muito próprio, talvez aquilo a que se chama muitas vezes de
vinhos de Terroir, que por serem como são não se conseguem repetir em mais
parte nenhuma, apenas ali naquele local. À primeira vista parecem não ser de
fácil abordagem, mas antes pelo contrário conquistam ao primeiro contacto,
apesar de que precisam que se dispense algum tempo com eles no copo para melhor
mostrarem tudo o que têm para nos dar, como as boas amizades que se vão
construindo ao longo dos anos, estes vinhos ganham exactamente com isso... com
os anos, não muitos mas sim os suficientes. Bebam-se logo após serem
colocados no mercado, ou guardem-se algumas garrafas para ir acompanhando a sua
evolução pois são vinhos que com o tempo vão mostrando toda a sua nobreza.
Os brancos são dois, um 100% Rabigato
(Dona Berta Reserva Rabigato Vinhas Velhas) e um vinho de lote feito de uma
Vinha Centenária (Dona Berta Reserva Vinha Centenária), dois brancos onde o que
os une é a frescura de conjunto, o primeiro a mostrar-se pleno de frescura,
destaque para a limpidez do conjunto de aromas e sabores frutados, com maçã
verde, flores e ervas do monte, sempre com um travo herbáceo em fundo mineral.
O topo de gama dos brancos é o Vinha Centenária, onde o lote mostra a sua
complexidade, refinado pela passagem por madeira, este vinho é um salto em
frente em relação ao anterior, fino e refinado pelo amparo da barrica ganhando
por isso também em complexidade, mantendo uma boa dose de frescura.
Nos tintos a escolha aumenta, desde o
Reserva, no seu perfil de fruta limpa e fresca com travos herbáceos bem frescos
a ligarem-se com madeira discreta mas que confere refinamento ao conjunto,
bastante equilibrados e frescos, passagem de boca com alguns taninos a pedirem
tempo de guarda mas que fazem destes vinhos companheiros vocacionados para a
mesa. Destaque para um tinto 100% feito a partir da casta Sousão/Vinhão, o
Reserva Especial, um vinho diferente mas muito curioso, sem ser vinoso ou
carrascão como se poderia esperar de um Vinhão, este mostra-se mais senhorial e
polido no trato, bela complexidade mostrando-se um vinho que agradará a todos,
um pouco mais vegetal que frutado, tem tudo para ser um rei à mesa e é com a
Lampreia que gosta de brilhar.
No seu todo são vinhos com forte pendor
gastronómico, companheiros da boa mesa, de personalidade vincada e que merecem
ser conhecidos e provados por todos os apreciadores de vinho.
texto publicado originalmente na revista Tribuna Douro nº80
texto publicado originalmente na revista Tribuna Douro nº80
4 comentários:
João, provei na essência do vinho e apreciei bastante. Ficou combinado numa próxima ida a Foz Coa, visitar a adega e prová-los um pouco melhor.
Sérgio, são vinhos muito especiais, talvez o que se pode chamar de vinhos de terroir, ali faz-se vinho como eu gosto, identidade, alma, paixão e que se dão lindamente à mesa.
Thanks for a intersting post. It seems like a very interesting series Dona Berta. I am quite a fan of the modernly produced wines using old traditional portuguese grapes. this should like a unique series. However, I have not come across the wines in garrafeiras in Lisbon.
May i ask where do they sell and current price level?
/ anders
Hi Anders... try the Garrafeira Campo de Ourique.
Prices... start near 12€ to go near 25-30€ with the top wines.
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